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Este microbook é uma resenha crítica da obra: Can’t even: How Millennials became the burnout generation
Disponível para: Leitura online, leitura nos nossos aplicativos móveis para iPhone/Android e envio em PDF/EPUB/MOBI para o Amazon Kindle.
ISBN: 978-65-5511-201-6
Editora: HarperCollins Brasil
Um aspecto deve ficar claro desde o início: o burnout não é um problema social. Na prática, trata-se de uma importante questão social que, evidentemente, não será superada por meio de aplicativos de produtividade, máscaras de tratamentos faciais, bullet journals ou a adoção de uma alimentação vegana.
Apenas somos atraídos pelas pessoas desse tipo porque elas nos parecem convincentes, prometendo que nossas vidas podem ser mais centradas e fundamentadas. Bastaria, assim, sermos um pouco mais disciplinados.
Definitivamente, todos já consideramos utilizar um novo modelo de organização, seja para priorizar e-mails ou para planejar melhor as refeições. Segundo a autora, todas essas pretensas soluções não passam de paliativos, uma vez que as causas desse mal-estar social são muito mais profundas.
Em síntese, a única forma de prosseguir consiste na criação de uma estrutura e de um vocabulário que nos leve à reflexão clara, tanto de nós mesmos quanto dos sistemas que contribuem para o burnout.
O conceito de cultivo combinado é explicado pela autora como o processo no qual as crianças passam a desenvolver um extenso vocabulário, até se sentirem capacitadas para questionarem autoridades, planejarem suas exigências, aprenderem a negociar seus interesses e a defenderem as suas necessidades.
Por fim, as crianças precisam, segundo Petersen, ser treinadas para se tornarem boas funcionárias, executando diversas tarefas simultaneamente e alimentando contatos.
Em outras palavras, todos os aspectos da vida das crianças podem ser otimizados, a fim de aprimorá-las a ponto de deixá-las prontas para entrar no mercado de trabalho. O problema é que essa educação não respeita ou estimula as características inerentemente infantis, convertendo os pequeninos em “miniadultos”.
Assim, as expectativas e as ansiedades típicas da vida adulta já começam a ser introjetadas na mais tenra idade. No fundo, o cultivo combinado consiste em uma prática de classe média.
Todavia, nas últimas três décadas, esses ideais ultrapassaram as barreiras de classe, consolidando-se como a fundação daquilo que se convencionou chamar de “boa criação”. Esse processo é ainda mais intenso nas famílias que perdem (ou temem perder) seu status e a decorrente sensação de pertencerem, pelo menos, à pequena burguesia.
Para abordar o capital humano, no âmbito da geração Millennial, Petersen utiliza a contextualização do autor Malcolm Harris, segundo o qual, “o valor presente dos ganhos futuros de uma pessoa, ou o valor imaginado da venda de uma pessoa (tal é a definição de “capital humano”), se fosse possível comprar e vender trabalhadores livres”.
Embora essa definição pareça grosseira, compreende uma clara visão do que o sistema capitalista faz com os seres humanos que vivem do trabalho. Semelhantemente às máquinas com as quais trabalhamos, o nosso valor é mensurado em termos da capacidade de gerarmos lucro para nossos empregadores.
Em todos os processos de negociação de salários ou de contratação, os empregadores se perguntam: “o quanto esse indivíduo vale?” e, ainda, “será que ele será um bom investimento?”
Os empregadores podem conseguir “bons negócios” ao oferecer um valor inferior ou, simplesmente, apostar que os valores ostensivamente baixos de seus funcionários aumentarão com o passar do tempo.
Caso seja um trabalhador braçal, o seu valor primário baseia-se no seu corpo e na sua saúde. Se, por outro lado, atua no setor de serviços, o valor reside na habilidade de completar tarefas com eficiência, precisão e conhecimento.
De igual modo, se trabalha em algum setor criativo, o seu valor é medido pela quantidade, regularidade e qualidade dos produtos de sua mente. Quando qualquer uma dessas capacidades desaparecem, os trabalhadores se tornam menos valiosos. Consequentemente, seu capital humano diminui.
Desde já, podemos ver como esse conceito, disseminado por toda a sociedade, cria problemas. Além disso, sempre que o valor de um indivíduo é determinado por sua capacidade de trabalhar, pessoas idosas ou com deficiência, por exemplo, não são valorizadas.
Tentar manter, cultivar e encontrar o seu “emprego dos sonhos” implica em renunciar à solidariedade para obter mais serviço. Dito de outra forma, se um determinado colega de trabalho insistir em trabalhar em um dado horário ou, simplesmente, em tirar férias, isso não é compreendido como o estabelecimento de limites saudáveis entre a vida profissional e a pessoal.
Na atualidade, quando um colega age assim, os outros consideram que ele abre uma oportunidade para os outros mostrarem que podem trabalhar com mais qualidade, com mais afinco do que ele.
A nossa autora oferece um exemplo pessoal: na redação de um jornal em que trabalhava, os repórteres podiam escolher entre tirar 1 dia de folga e, para compensar, tinham que cobrir o próximo evento traumático, como assassinatos ou tiroteios em massa.
No entanto, poucos profissionais tiravam folga, pois, no jornalismo, há milhares de pessoas concorrendo pelo seu emprego, de modo que essa não é, verdadeiramente, uma oportunidade para descansar, mas uma possibilidade de se diferenciar dos “concorrentes”, destacando-se como alguém que nunca precisa de tempo livre para se recuperar física e mentalmente.
Quando todos, em um ambiente de trabalho, pensam em si próprios como trabalhadores independentes em constante competições, isso gera as condições ideais para o surgimento do burnout.
Assim, os funcionários determinam o quão cedo podem chegar aos escritórios e a que horas podem sair. Os demais tentam exceder esse limite. Obviamente, o resultado acumulado nessa atmosfera é bastante negativo.
Agora que chegamos na metade da leitura, nos concentraremos em três aspectos cruciais para entender a relação entre o esgotamento profissional crônico e a geração Millennial: o papel das mídias sociais, a ausência de ócio e os fundamentos da criação familiar.
O Facebook moldou a vida social dos Millennials na adolescência e no começo da vida adulta. Entretanto, na atualidade, a maioria dos integrantes dessa geração abandonou esta rede social.
Com efeito, o Facebook é político e tóxico. Ademais, saber todas as formas pelas quais a empresa explorou os nossos dados pessoais contribuiu decisivamente para a sua perda de popularidade.
Boa parte dos Millennials começou a utilizar a rede social pelos grupos: secretos, públicos e particulares, girando em torno de discussões de interesses, hobbies e podcasts.
Segundo a autora, uma parcela considerável dos Millennials mais jovens ainda utiliza o Snapchat. Para muitos nerds, acadêmicos e escritores, o Twitter funciona quase como uma compulsão.
O Pinterest, por sua vez, tem os seus próprios atrativos psicológicos, enquanto as comunidades que integram o Reddit possuem uma espécie de sedução viciante. Bem como o Twitter, o LinkedIn exerce o mesmo papel, só que para indivíduos com “MBA”.
No entanto, a principal responsável pelo burnout, de acordo com Petersen, é o Instagram. Essa afirmação parece contraditória, uma vez que o apelo do Instagram reside no fato de ser uma espécie de “Facebook sem drama”, especializado em fotos.
Porém, fazer a curadoria dessas imagens é uma tarefa exaustiva. Olhar para elas também é, de certa forma, cansativo: uma interminável relação de fotografias que, além de sempre serem melhores do que as suas, são mais organizadas e equilibradas. Ou seja, o feed do Instagram é um instrumento automático de geração imediata de mal-estar.
A relação da geração Millennial com o lazer é terrível. No passado, os momentos de lazer representavam, segundo Petersen, “a hora de fazer o que quiser”, isto é, 8 horas do dia não gastas com descanso ou trabalho.
Os indivíduos cultivavam hobbies, que podiam ser quaisquer coisas, desde a construção de aeromodelos a caminhar sem rumo. O que mais importava é que as pessoas não tinham o objetivo de se tornarem mais atraentes, reforçar status social ou obter renda extra.
Tais atividades eram feitas, unicamente, por prazer. Por esse motivo, a autora considera extremamente irônico que os Millennials (sempre estereotipados como egocêntricos) tenham perdido a noção do que significa a busca pelo prazer pessoal.
Reflita: o seu lazer parece restaurador, divertido ou, até mesmo, autodirecionado? Na atualidade, sempre pensamos duas vezes antes de nos dedicarmos a momentos de puro prazer. Por exemplo:
Muitas pessoas que têm o hábito de correr pelas manhãs não sabem se fazem essa atividade porque realmente gostam ou porque se trata de um modo “produtivo” de disciplinar os seus corpos. Quem ainda lê livros o faz porque adora determinado gênero literário ou apenas para contar aos outros que é um leitor voraz?
Tenha em mente que esses fenômenos não são inteiramente novos, porém, contribuem para que entendamos a primazia do burnout entre os Millennials. Afinal, não há como se recuperar adequadamente de um dia no trabalho quando o “tempo livre” também parece trabalho.
Desde uma perspectiva histórica, os pais já foram obrigados a tomar decisões acerca de quais filhos deveriam abandonar os estudos para trabalhar ou, em ocasiões mais extremas, quais receberiam maiores porções de comida.
Essas decisões são terríveis e, também, sempre foram socialmente reconhecidas como difíceis. Porém, a cultura atual sobre a criação de filhos tem suas dificuldades constantemente ignoradas ou deliberadamente negadas. Afinal, todos precisam gerar a aparência de que sabem como criar os seus filhos do melhor modo possível.
Os costumes da atualidade reforçam ideais que, na realidade, são inatingíveis, culpando, individualmente, os pais pelas falhas sociais que ocorrem. A consequência é o desespero e o ressentimento, especialmente para as mulheres que acreditaram nas promessas de parcerias igualitárias com seus cônjuges.
Similarmente ao paradigma do trabalho em excesso, isso equipara a exaustão com a habilidade (no sentido de “devoção” ou “aptidão”): os considerados “melhores pais” são aqueles que se entregam até não restar nada de si mesmos. Infelizmente, não há nenhuma comprovação (sequer, alguma evidência) de que esses comportamentos melhoram a vida de suas crianças.
Não precisamos (e, tampouco, devemos) aceitar a “forma como as coisas são”. De acordo com a autora, temos de afastar o sentimento de culpa por eventuais fracassos sociais, compreendendo a necessidade de superar o medo de perder o que já temos conquistado em nossas vidas.
Dito de outra forma, Petersen enfatiza que não basta melhorar as coisas apenas para si mesmo: é imprescindível atuar coletivamente. Para tanto, mudanças verdadeiras e significativas devem partir, inclusive, do setor público. Nesse sentido, antes de tudo, precisamos aprender a votar massivamente para a eleição de políticos que, de fato, defendam incansavelmente a qualidade de vida de todos.
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Residindo, atualmente, no estado de Montana, Estados Unidos, Anne Helen Petersen é doutora em Estudos da Mídia pela célebre Uni... (Leia mais)
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